Carl Jung, baseado num pressuposto holístico, onde compreende o universo humano como um grande emaranhado de acontecimentos, teoriza sobre aquilo que chama de sincronicidade
"Esse princípio se aplica a eventos que ocorrem juntos no tempo, mas não são a causa um do outro(...) Ele acreditava que muitas dessas experiências não podem ser explicadas como coincidências casuais; em vez disso, elas sugerem a existência de um outro tipo de ordem no universo além da descrita pela causalidade. os fenômenos sincrônicos são atribuídos à natureza dos arquétipos. Um arquétipo tem caráter psicóide, isto é, ele é tanto psíquico quanto físico mesmo que não exista nenhuma percepção direta dele. o arquétipo não causa ambos os eventos, ele possui uma qualidade que permite que ocorra a sincronicidade."( Hall, Lidzey e Campbell, apud Jung, 2008)
No filme Donnie Darko de Richard Kelly notamos a percepção a priori dos acontecimentos que se materializam em objetos visíveis, são de importância esses objetos mas no decorrer do filme eles não tem nenhum nome, nenhuma significância. A intuição do personagem Donnie Darko o leva a pressupor possibilidades de influência desses objetos no futuro. Alguns, como o "grande coelho" são 'ilusões', ou seja, imagens duma perspectiva individual do sujeito, que lhe avisa sobre seu próprio destino. O 'declínio' da vida do personagem é uma resposta à seus delírios, delírios que lhe revelam sua finitude, a real insignificância de uma vida que terá fim, assim, na verdade, a incapacidade de "vestir-se de homem" é também parte da compreensão anterior de uma vida finita.
Quando fala sobre o "desvelar do caminho de deus", que seria também uma previsão do futuro, o personagem revela a compreensão que tem do self em si, e do direcionamento que ele toma , em sua profundidade de energia pura, enquanto existência objetiva, mas ainda assim anterior à consciência diminuta de uma realidade estática, predominante.
O personagem Donnie Darko revela a sua terapeuta sobre seu sentimento de sentir-se sozinho, oque, partindo do principio de que ele sabe, inconscientemente, onde os surtos são a prova de sua incapacidade de lidar com isso, a realidade das predições reais de um mundo objetivo, mensurável, da realidade crua, significada pela própria imperfeição do homem.
No final do filme, quando as imagens estão 'voltando', o personagem aparece rindo antes de morrer amassado por uma turbina de avião. Num curto espaço de tempo, viajando em sua imaginação prevê a possibilidade de tal acontecimento, num segundo plano imaginário e mental. Ali traça uma vida completa, com as experiências até tal momento, de tal forma que todo o filme é um "tubo temporal" onde ele traça a possibilidade da realidade de sua morte, que de alguma forma lhe parece iminente, e termina rindo com o desfecho de sua própria imaginação, isto é, ri da capacidade de imaginar tão distante e da impossibilidade de driblar o destino. Imagina-se, então, evitando a morte, continuando sua vida depois da fuga da morte, qual morte não aconteceu por não ter acontecido(soa redundante, mas é que no "tudo temporal" a morte não era possibilidade, foi descartada por ter sido driblada), e termina, num plano que chamaremos de 1, imaginando antes de morrer, enquanto num plano 2, no segundo plano imaginário, evidencia todos os elementos de sua morte. NO IMAGINÁRIO EM QUESTÃO DE SEGUNDOS CAPTURA A RESPOSTA DA FUGA DA MORTE, MAS RI DAS PRÓPRIAS EVIDENCIAS. Deita-se de lado, fecha os olhos, e apenas morre.
Se o plano da imaginação esta submetido ao plano 1, então, toda a pergunta, todo o movimento imaginário, é um movimento em relação à respostas do plano 1 realidade. Por algum motivo, sobrevivência talvez, os objetos sem significado são na verdade signos que nos direcionariam para uma resolução completa de nossos próprios problemas.
Voltando ao riso, é realmente engraçado o porque dele acordar rindo...
Levando em conta a menina que ele tinha se apaixonado, no segundo plano, ela era a mensagem de uma bondade perdida, de um amor possível que foi morto no final. Talvez, ele tenha se contentado pela capacidade de ter amado, de ter estruturado uma história mentalmente e ter assim pensado que ele havia evidentemente amado. Já que se sentia tão sozinho, descobriu em si, e não somente em si, pois a menina existia na realidade(sincronicidade), num nível então inconsciente, que na verdade era questão de tempo para amar, para ser amado.
Não há porque fugir quando já se esta em casa. No ultimo momento da vida todas as moléculas de suas experiências revelaram a realidade dos fatos, desmembraram a máscara de sofrimento e lhe trouxeram à percepção uma visão do amor real, que só se matinha ali revestido, imerso no arquétipo.
No decorrer do filme, enquanto o personagem principal atua como um 'esclarecedor', os coadjuvantes enfrentam a si mesmos mediante suas imposições. Imersos em sonhos, lhes é revelado a realidade, a consequência real, de seus rígidos e ritualísticos atos, as finalidades de seus egoísmos lhes fisgam todas as noites quando acordam transpirando. Sabem, através de um passeio imaginário, usando a objetividade das frias relações sociais como base, da verdade intenção de si mesmos, e da infrutividade de suas ações, que sempre terminam na noite com rostos fechados(final do filme) encarando os próprios demônios.
Continua:
Existe também a possibilidade de todos estarem compartilhando o mesmo sonho, assim podemos elucidar um segundo plano de existir onírico.
Na realidade do cotidiano nos sentimos 'mal', as vezes, por nada aparente. Numa conversa casual podemos nos sentir exaustos, ou felizes, o que depende do tom da voz daquele à qual nos direcionamos, da postura que toma no discurso. Se, toda falha de discurso cria uma desconexão, toda falha é uma incapacidade de sensibilidade por algum dos lados. Essa 'falha' imperceptível é sentida, gera remorso e angústia, sentimentos reconhecidos por Donnie Darko hipnotizado.
Os sentimentos se dão pela interpretação do simbolo, existe o orador, o receptor, e uma terceira capacidade interpretativa, de tal forma que o símbolo é semântico e não mensurável, apesar da estrutura de sua síntese. Desta forma o que há de mais real é o que sentimos, a interpretação por via da razão é sempre uma estratégia de fuga em relação ao sentir absoluto que nos toma.
No sentimentos, então, esta a verdade. Todo o desvio é racional, estratégico e civilizado.
Nessa realidade "sentimental" não haverá imagens, muros ou portas, que possam esconder o sentir. A inata capacidade da percepção de interpretar o calor da sinceridade, de uma expressão condizente com a pura energia de si, mascarada geralmente por personas, por posicionamentos.
Bom, valeu Ingrid pela recomendação rs